sábado, 19 de março de 2011

Capítulo 20 - A vergonha volta à tona

Eu mal podia viver graças à vergonha. Não pela vassourada que Sr. Rafael deu no moleque, nem mesmo por ter sido demitido, mas sim por ter de voltar àquela casa, que já era do Compadre por direito. Mais uma vez engoli a vergonha e vivi uma grande humilhação. Hoje não vejo isso como uma vergonha tão grande que não possa ser superada, mas acredite, naquela época, isso fazia todo o sentido!
            Vivi essa minha vida insignificante, assim como vivi a vida de meu querido afilhado... Foi uma felicidade tão grande ir à sua formatura... Tudo muito simples, como era costume, mas também muito bonito. Não chorei, pois homens não choram. Hoje, já sem esses escrúpulos, lhes confesso que chorei sim, escondido no banheiro da minha casa. Foi realmente emocionante, quando no agradecimento aos pais, ele citou os nomes do Compadre, da Comadre, e o meu, dizendo que era um segundo pai para ele. Ele acabara de se formar no nível ginasial e já tinha 15 anos! Juntei minhas economias, que não renderam uma soma muito grande, e comprei a bicicleta que ele tanto pedia ao compadre, e que esse se negava a comprar, mandando-o usar a bicicleta velha que eles tinham.
            Alguns anos depois, quando ele já estava no último ano do nível colegial, eu o levei para o lado noturno da cidade... Aqueles seus cabelos loiros e longos foram a atração das casas por onde passava. Ele adorou essa parte “obscura” da cidade, assim como eu, na primeira vez em que lá fui.
            Sempre tive muito orgulho dele, até mesmo quando descobria coisas realmente horríveis, como quando soube que ele havia levado uma mulher da vida para dentro da casa do Compadre, para que ela jantasse bem, antes de fazer seu serviço. Nem preciso dizer a reação do Compadre que, se eu não chegasse na hora decisiva, tinha feito com Sr. Rafael o mesmo que fez com D. Maria. Depois de uma longa conversa, fiz o Compadre entender que ele era apenas um garoto sem juízo, como todos os outros.
            Ele sempre teve um companheiro para guiar-lhe os passos. Quando uma dúvida surgia, ele corria até mim, e fazia a pergunta; quando brigava com seu pai, corria para minha casa, me contar o que houve, e pedir minha opinião, que ele já sabia que seria completamente parcial a seu favor.
            Assim, vi aquele pequeno bebê virar criança, que virou um lindo adolescente, que fazia sucesso com tudo e com todas. Na verdade, não sei se isso é uma vantagem assim tão grande...

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